Monday, December 28, 2009





Acordos
Arlete Castro

São dois solos
um de um azul sutil
e o outro verdejante gentil
o primeiro desbravou o mar
e venceu Adamastor*
enquanto o outro foi a conquista
terra a perder de vista
sonho de Imperador.

Um canta o privilégio de heróis
que desenharam mundos novos ao mundo
o outro canta deitado,
eternamente em berço de esplendor
enquanto as suas ruas, nuas…
esperam o seu favor.

Um trouxe na bagagem a língua
o outro a língua aprendeu
e moldou-a ao seu gingado
e agora faz de conta que o idioma é seu.

O primeiro canta o fado,
a canção triste que o elegeu
o outro samba e faz poesia,
escreve histórias
e perpetua as memórias
na língua que o acolheu.

E entre o gerúndio falado
em cada contínua acção
muda o outro o verbo atado
ao estar que auxilia na expressão,
dando ao infinitivo
a devida projecção.

E moldam o seu falar
cada qual com seu requinte
tentam acordos, fazem sena
discutem sobre o Trema,
dispensam o “p” e o “c”
das palavras onde se escondem
e entre circunflexos e agudos
não sabem se vale a pena.

Enquanto que a língua tem asas
e voa tranquila e serena
de um lado tem cor tropical
do outro parece formal,
mas no fundo é senhora
recusa-se a parar a história
está nos relvados do mundo,
na Garota de Ipanema,
no Nobel de Literatura
e nas telas de cinema.

E se é pronuncia ou sotaque
na verdade não sei
mas é língua de poetas
de épicos e canções
e se o poeta está certo
é “a última flor do lácio
inculta e bela!” **
expressando a Cultura,
gestos e maneiras
de muitas gentes
precioso legado
ao mundo deixado
tal qual viva semente.

* Alusão aos Lusíadas num dos cânticos quando o herói colectivo enfrenta Adamastor, o gigante dos mares.

**Olávo Bilac

Tuesday, December 15, 2009

Thursday, December 3, 2009


Pôr-do-Sol

Quando andar em busca de compreensão,
Pare e olhe para este chão
Há sementes a brotar por todo lado
Vê?
Elas aparentemente morrem
E quando menos a gente espera
Brotam…
Dão à luz ao verde que te encanta o olhar.

Quando tentar entender o porquê
Observe,
Nem tudo é como a gente vê
O que para uns é um dia que se finda,
Levando a esperança de solução
Para o outro é Pôr-do-Sol,
Paisagem desanhada no horizonte
Fonte de alegria e contemplação.

Quando quiser compreender
Olhe essa gente a sua volta
São rostos perdidos na multidão
São carne, osso e semente
Alguns andam sorridentes
Outros vertem lágrimas e vão
Em busca do ganha pão.
Aparentemente sem nome
Alguns fartos outros com fome
Transbordando vida
Que vai além da compreensão.

Quando não houver respostas
Olhe para esses pequeninos tão perto
São o futuro desenhado em miniatura
Renovando a esperança num sorriso
Fazendo brotar vida de novo
Num mundo que precisa de riso.

Quando não entender
Erga os olhos pra ver
É o Pôr-do-Sol
Que desenha Graça
Durante o entardecer.

Arlete Castro
03.12.2009

Sunday, November 1, 2009

Às Muheres Aglow

Deus não tem mulher
mas fez-se homem a partir do ninho interior
de uma delas
que o amamentou nos seus peitos
em momentos de carinho

Deus não tem mulher
mas sabe a massa de que são feitas por dentro
e por isso as ama ainda mais

Deus não tem mulher
mas procura a sua intimidade
não dispensa o seu colo
o seu regaço incerto
o seu coração apertado

Deus não tem mulher
mas preferiu-as no seu gesto criador
fazendo delas fábricas de vida e ternura
onde fez repousar a sua gentileza

Deus não tem mulher
mas fez delas a peça que faltava no puzlle masculino

Deus não tem mulher
mas chamou-as a habitar todas as esquinas da História

Deus não tem mulher
mas trabalha para que todas as mulheres o desejem com ardor

Deus não tem mulher
não tem uma mulher, tem muitas
todas as Marias, Susanas, Lídias e Vitórias
Isabéis, Manuelas, Rutes, Saras, Fernandas
Josefinas, Luísas, Anas, Joaquinas
Carolinas, Martas, Antónias
e até Madalenas
todas as que queiram abrigar-se
nos seus braços de segurança e amor.

Brissos Lino
Outubro de 2009

Tuesday, September 22, 2009

Que Pena do Tempo!




Que Pena do Tempo!

Se o tempo tem pena
que vai e que vem
escrevendo a historia
sem esquecer ninguém,

Então desperta a mocinha
que não sai da janela,
antes que a pena do tempo
passe antes da banda
nas ruas da vida dela.

Consola a senhora
que chora sozinha
e mostra-lhe memórias
que nem a pena do tempo
pode apagar da sua história

Lê no rosto singelo
do homem que é velho,
as marcas que ao tempo
pensou pertencer
mas que falam de amores,
de sonhos e dores
e de uma vida
que vale a pena viver.

E conta ao poeta
que o tempo tem pernas
que as vezes anda
outras vezes espera,
mas que os versos que escreve
tem asas que o tempo
não pode deter
pois eternizam o amor
que doeu em mim
e exalou de você.

Tem pena da pena
com começo e fim
e mostra-lhe a letra
escrita por ela
eternizando o momento
que o tempo levou
cravando pra sempre
em letra eternas
alegrias e sonhos
e tempos de dor
as suas histórias
e os seus contos de amor!

Arlete Castro
Agosto de 2009

Tuesday, September 8, 2009

Plantio




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Co-autores – Arlete Castro e Mauro Veras
.
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Brincar com palavras desde sempre
nos temas presentes na existência

buscar a gema preciosa do vocábulo
sua essência, em campos abandonados

fluir em inspiração e lapidar
os caminhos e seus encantos ...
eis a sina que carrego comigo.
No abrigo de um caderno amarrotado
que trago na mente
nas mãos, através dos dias
o mundo além dos traços denuncia
o cotidiano como tela

nem sempre macia,
nem sempre de pedra,
mas a vida eternizada
como fosse uma aquarela.

E entre formas e reformas
a linguagem da alma se conforma em versos

E quem bebe desta água sequer desconfia
que os dedos que tecem e fiam minha lavra
são os mesmos que acariciam o desespero
e seus medos, conformando a dor em magia.

Brincar com palavras enquanto passam os dias
destravar as aldravas
abrir a janela da alegria

fazer do tempo que caminha devagar
algo mais do que a rotina que me prende

semear a terra árida que transcende sua aridez
e transpira na alma a semente que se faz poema

e caminhar e transcender ...
e renascer poesia.
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Arlete Castro & Mauro Vera
Maio de 2009

Monday, September 7, 2009

Gigante Menino


Gigante Menino




Era gigante o menino
Há muito que não o via.
Pensei encontrá-lo
Em berço esplendido deitado,
Mas quando o vi
Estava ferido, cansado...

A casa era a mesma
Rodeada de palmeiras,
Cheiro à maresia,
Poetas e boa companhia.

Mas o menino chorava.
Sentia saudades do sabiá
Que dantes gorjeava por cá.
Do brado heróico do seu povo
Que cessou de ecoar
Porque teme a morte
Que invade morros, cidades...
Atropela a sorte,
Aterra na segurança do solo
E não pára, explode...

O gingado era o mesmo.
Popular trilha sonora da sua história,
Mas o verde louro da sua flâmula,
Perdeu a fama, desbotou...
E o ouro, amarelo legado,
Outro menino roubou.

Cresceu o mulato menino.
Deixou Inocência na favela
E sem tempo,
Trabalha... Batalha...
Engaveta suas mazelas
E vai sambar...

Continua belo
O gigante menino
Adornado por um céu
Ainda risonho
Aonde a lua vem brincar.
Ele acredita, tem fé na vida.
Enxuga as lágrimas
Na esperança verde do relvado,
E ecoa um grito guardado
É apenas um menino
Que não desistiu de sonhar...


Arlete Castro
Agosto de 2007